segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Rigor da Justiça Eleitoral não impede compra de votos

Campo Grande News

Em tempos de campanha, os eleitores pedem de tudo aos candidatos: botijão de gás, cesta básica, agendamento de consulta, jogo de camisas para o time de futebol, pagamento de contas, gasolina, material de construção e até casa.

Um candidato à reeleição, e que pediu para não ser identificado, revelou ao Campo Grande News que a compra de votos continua muito viva e que ele mesmo a pratica.

O candidato explicou como faz para identificar o eleitor que tem o voto “que vale a pena ser comprado”. Segundo ele, existem três tipos de eleitores: o que acompanha o candidato “e quer apenas um agrado, porque acha que você deve isso a ele”; aquele que oferece o voto para todos os candidatos e que “só vai votar em você, se você tiver muita sorte”; e o vendedor de votos “profissional”, que promete angariar eleitores por todo o bairro em troca de dinheiro.

Na maior parte dos casos, os eleitores aproveitam a ida dos candidatos ao bairro para pedir favores. Mas existem ainda alguns que vão atrás dos concorrentes a cargos eletivos nos comitês ou nos gabinetes, no caso dos que têm mandato.

O Campo Grande News não encontrou dificuldade para encontrar gente disposta a vender o voto, embora todos prefiram não revelar as suas identidades. Na Vila Nhá-Nhá, um bairro carente de Campo Grande, a reportagem foi confundida com alguma equipe de campanha de candidato. “Compra meu voto”, disse uma mulher. “Quanto está dando?”, perguntou outra.

Fome - Sem ter o que comer e com energia elétrica e água cortadas, uma mulher de 54 anos disse que não teria problemas em vender o voto em troca de comida. “Eu preciso de comida, o meu filho mais velho morreu atropelado e estou com três filhos presos”, afirma. Desempregada, ela sobrevive graças a ajuda de uma filha.

Na panela , na última sexta-feira, havia apenas um pouco de arroz e ovos cozidos. Toda a casa da senhora está restrita a um único cômodo, que funciona como sala, cozinha, banheiro e quarto.

Descrença - Vivendo em uma situação bem mais confortável, uma jovem de 17 anos disse que só não venderá o voto nesta eleição porque ainda não tirou o título de eleitor. “Se eu tivesse meu título, eu venderia. Na época de eleição, todos os políticos só faltam pegar no colo, mas depois não fazem nada. Principalmente os vereadores”, afirma.

O cientista político Eron Brum explica que a compra de votos é tão antiga quanto a própria política. “Isso é histórico. O nosso sistema político sempre agiu dessa forma. Antes mesmo das cédulas, já se definia, desde a época do império, os cargos através de troca de favores”, afirma. Brum é jornalista com mestrado e doutorado em comunicação e política pela USP.

Ele diz que o problema é cultural. “Está enraizado no imaginário popular a história de cortar dinheiro ao meio e dar metade antes da eleição e outra metade depois, ou dar um pé de sapato. Tudo isso ficou no imaginário da política. Era uma ação entre amigos. Era dá lá, dá cá. Política ficou coisa de aproveitador”, afirma.

O cientista político diz que a venda do voto é comum “até nas classes chamadas informadas”, mas que essa prática só chegará o fim com uma Reforma Política e um Judiciário mais eficiente.

Para Brum, a proibição de showmícios e até mesmo de que sejam servidas comida e bebida durante reuniões com eleitores vai de encontro à cultura do “toma lá, dá cá”. “É bom. Comida e bebida também são formas de comprar voto”, afirma. “Isso obriga os candidatos a ter uma criatividade maior. É preciso mostrar que política é coisa séria. A radicalização é boa. Exagero neste sentido é bom”, afirma.

Ele acredita, em uma perspectiva otimista, que em 20 anos a compra de votos estará, finalmente, extinta. “A mídia fala de eleições o ano inteiro. Isso vai esclarecendo. Os políticos vão ter que avançar”, afirmou.

Assédio - Até mesmo candidatos de baixo poderio econômico, como os “prefeitáveis” Suél Ferranti (PSTU) e Henrique Martini (PSOL) dizem que já sofreram com o assédio dos eleitores, que querem tirar proveito do período eleitoral.

Suél conta que já foi abordado por pessoas que pediam dinheiro para pagar contas ou precisavam de trabalho. “Tem gente que pede para trabalhar na campanha, aí eu falo para eles procurarem os candidatos dos grandes poderios econômicos. Eu explico que nós fazemos uma campanha sem dinheiro. Teve um eleitor que pediu até um cargo na Prefeitura, para o caso de eu ser eleito”, diz.

Henrique disse que também recebeu pedidos de favores e que explicou que não poderia ajudar.

Legalidade - Na Câmara Municipal de Campo Grande, o discurso de todos os candidatos é o mesmo. Eles contam que existe o assédio dos eleitores que pedem favores pessoais, mas que eles (os parlamentares) não compram votos e que agem sempre de acordo com a lei.

Magali Picarelli (PMDB) diz que explica ao eleitor que a ajuda na época de eleição “é ilegal”. “Quero ganhar as eleições pelo meu trabalho”, afirma.

Vanderlei Cabeludo (PMDB) também afirma que cumpre a lei, mas que o número de pedidos é grande. “Eles pedem de tudo: médico, remédio, pedem para viabilizar moradia, e emprego, dentro e fora da campanha”, conta.

Marcelo Bluma (PV) diz que “é da cultura da eleição” o pedido de favores por parte dos eleitores, mas que a nova legislação tem freado isso. “São muito poucas as solicitações. Quando recebo, digo que não tenho condições”, afirma. Para Bluma, os pedidos de favores pessoais por parte dos eleitores têm diminuído por conta das novas regras dessa eleição, que tem acabado “com o clima de festa”.

Alex do PT avalia que a sociedade é carente e vê na eleição a chance de resolver seus problemas. “Eles aparecem com conta de luz, pedindo botijão e outros favores”, afirma.

Já Gilmar Olarte (PP) diz que só é procurado por parte dos eleitores que estão atrás de seus direitos constitucionais e que age de acordo com a lei e as prerrogativas do mandato.

sábado, 23 de agosto de 2008

Governo vê 'mercado de votos' no Congresso

A proposta de reforma política encaminhada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelos ministros Tarso Genro (Justiça) e José Múcio (Relações Internacionais) afirma que há um “mercado de votos” no congresso. De acordo com o texto, o apoio ao governo custa liberações de verbas e nomeações para cargos públicos, e, por conta das regras eleitorais, o Congresso atual não reflete a vontade do eleitor.

Folha de S. Paulo